Pesquisador divulga carta aberta em defesa do Edital Universal

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Considerando que:

1 – É fundamental recuperar o CNPq como estrutura que permita uma relação direta e não-corporativa entre os pesquisadores e um órgão de fomento tradicional da Ciência brasileira;

2 – O mecanismo mais simples e efetivo para a recuperação do CNPq como órgão de fomento relevante e fundamental para o Progresso da Ciência (Tecnologia e Inovação) brasileira é o lançamento de um Edital Universal com valores significativos;

3 – Os recursos deste Edital Universal permitiriam que pequenos grupos de pesquisa (os mais produtivos na minha opinião) sobrevivam sem depender de Coordenadores de INCTs, Pronex, etc;

4 – O maior empecilho para este movimento “renovador” da pesquisa nacional é o fato de que os pesquisadores da minha geração ocupam os cargos administrativos mais importantes na Capes, CNPq, Finep, etc;

5 – Nestes cargos, os ex-militantes de esquerda se sentem responsáveis pelo uso adequado dos recursos públicos;

6 – Segundo a lógica predominante destes administradores, a ciência brasileira só alcançará um status internacional através do fortalecimento e crescimento dos grandes grupos de pesquisa;

7 – Naturalmente, como os recursos financeiros são “limitados”, os recursos desperdiçados com os pequenos e independentes grupos de pesquisa (e das PPGs com níveis 3 e 4) devem ser reduzidos progressivamente;

8 – A melhor maneira de realizar esta “revolução” institucional com submissão da maioria dos pesquisadores brasileiros é convencê-los da importância da “elite” para o progresso da ciência criando programas tais como o “Ciência sem Fronteiras”, o qual, na prática e sem tanta propaganda, já existe desde o tempo de Oswaldo Cruz, Carlos Chagas (pai), Adolpho Lutz, Vital Brasil, César Lattes e tantos outros pioneiros da Ciência Brasileira;

9 – A importância desta “elite” é também ressaltada por um marketing enganoso tal como o anúncio feito algum tempo atrás de que “Os pesquisadores do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Astrofísica (INCT-A) publicaram, em 2011, um total de 202 artigos científicos em revistas indexadas. Desse total, 85% dos artigos foram publicadas em revistas definidas como Qualis A pela Capes, 5% como Qualis B e 10% em outras.”. Todavia, mais abaixo, sem tanto destaque ou, melhor, orgulhosamente, é relatado: O INCT-A “congrega 173 pesquisadores doutores ativos em pesquisa, distribuídos em uma rede virtual de 31 instituições espalhadas pelo País” (sic), o que resulta em 1,18 artigos por pesquisador doutor, o que deve estar (especulação minha) bem abaixo da produção de muitos PPGs classificados como 3 ou 4 pela Capes;

10 – Os recursos disponíveis para o Edital Universal do CNPq são hoje em dia, meramente simbólicos, pois como reza a CHAMADA UNIVERSAL – MCTI/CNPQ N º 14/2012 (o antigo Edital Universal): “A presente Chamada tem por objetivo selecionar propostas para apoio financeiro a projetos que visem contribuir significativamente para o desenvolvimento científico e tecnológico e inovação do País, em qualquer área do conhecimento. As propostas aprovadas serão financiadas com recursos no valor global estimado de R$ 130 milhões para itens de capital e custeio, sendo R$ 50 milhões oriundos do orçamento do CNPq e R$ 80 milhões oriundos do FNDCT/Fundos Setoriais, a serem liberados em duas parcelas, de acordo com a disponibilidade orçamentária e financeira do CNPq.” (sic);

11 – O INCT-A (A de Astronomia) recebeu segundo informação no site: http://www.astro.iag.usp.br/~incta/incta_orcamentos/ORCAMENTO_abril2010.pdf “Obs: O projeto inicial de R$ 6 milhões teve corte de 20% e mais 10% da parte da Fapesp. A Capes acrescentou R$ 287.978,00 em bolsas” (sic), o que corresponde a cerca de 5% (4,6154% para ser mais exato) do total da CHAMADA UNIVERSAL – MCTI/CNPQ N º 14/2012;

12 – Embora, não tenha conseguido obter o orçamento do Programa Ciência sem Fronteiras que “é um programa que busca promover a consolidação, expansão e internacionalização da ciência e tecnologia, da inovação e da competitividade brasileira por meio do intercâmbio e da mobilidade internacional. O projeto prevê a utilização de até 101 mil bolsas em quatro anos para promover intercâmbio, de forma que alunos de graduação e pós-graduação façam estágio no exterior com a finalidade de manter contato com sistemas educacionais competitivos em relação à tecnologia e inovação” (sic), consegui fazer a seguinte estimativa: se o valor de uma bolsa mensal for US$ 1,000.00 (mil dólares), o que é equivalente a R$ 2.000 (dois mil reais mensais), teremos um total de R$ 202 milhões. Bem, nem os US$ 1000.00 correspondem à realidade, nem está especificado se são 101 mil bolsas por mês, por ano ou por quatro anos. De qualquer modo, se considerarmos o mínimo do mínimo: bolsa de R$ 2.000 num período de quatro anos, ou seja, cerca 25 mil bolsas em 2012, teremos cerca de R$ 50 milhões investidos durante o ano de 2012 no Programa Ciência sem Fronteiras. Este valor é equivalente à quase a metade dos recursos destinados à CHAMADA UNIVERSAL – MCTI/CNPQ N º 14/2012 (50 milhões divididos por 130 milhões).

13 – “No programa Ciência sem Fronteiras, as áreas prioritárias são: Engenharias e demais áreas tecnológicas; Ciências Exatas e da Terra; Biologia, Ciências Biomédicas e da Saúde; Computação e Tecnologias da Informação; Tecnologia Aeroespacial; Fármacos; Produção Agrícola Sustentável; Petróleo, Gás e Carvão Mineral; Energias Renováveis; Tecnologia Mineral; Biotecnologia; Nanotecnologia e Novos Materiais; Tecnologias de Prevenção e Mitigação de Desastres Naturais; Biodiversidade e Bioprospecção; Ciências do Mar; Indústria Criativa (voltada a produtos e processos para desenvolvimento tecnológico e inovação); Novas Tecnologias de Engenharia Construtiva; Formação de Tecnólogos.”. Ou seja, as áreas de Ciências Sociais e Humanas não são prioritárias. Eu me perguntei porque e, no momento, tenho duas hipóteses provisórias. A primeira é que a História, o Cinema, a Música, a Literatura, a Psicanálise, as Ciências econômicas e outras afins têm tal prestígio no exterior que a tendência dominante já é a imigração de pesquisadores internacionais para o Brasil. A segunda é que os estudantes participantes do programa Ciência sem Fronteiras terão a oportunidade de utilizar sofisticados equipamentos não disponíveis no Brasil, multiplicando a produção científica dos seus orientadores brasileiros, elevando-a a um novo patamar, segundo os critérios de avaliação pelo Qualis. Além disso, o emprego de sofisticados equipamentos no exterior será um importante argumento para a obtenção dos recursos financeiros necessários para a importação destes equipamentos, novamente colocando a ciência brasileira no nível de prestígio que ela tanto almeja.

Proponho que os sonhados recursos provenientes do Pré-Sal e destinados ao progresso da ciência brasileira permitam que montante financeiro do Edital Universal nos anos vindouros seja proporcionalmente equivalente ao do “primeiro Edital Universal (que) foi lançado no ano de 2000. Com um montante de R$ 28,4 milhões, em recursos para apoiar os projetos, o Edital conseguiu financiar 952 propostas, das 7,4 mil apresentadas.” (sic)
(http://www.fameb.ufba.br/index.php?option=com_content&view=article&id=231&Itemid=160)

Certamente, existe a possibilidade de que o enorme montante destinado ao Edital Universal em 2000 tenha sido parte das comemorações dos 500 anos do Descobrimento do Brasil e que nada mais restaria à maioria dos pesquisadores brasileiros, especialmente aqueles que se dedicam às áreas das Ciências Sociais e Humanas, do que esperar a comemoração dos 600 anos do Descobrimento do Brasil, a ser comemorado em 2100.

Niterói, 25 de setembro de 2012

Luiz G Gawryszewski – Professor aposentado
PPG em Neurociências – UFF
Pesquisador II do CNPq

Fonte:JC e-mail 4591, de 26 de Setembro de 2012.
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