Cientistas e a Lei 13.123/2015


José Sarney Filho
Ministro do Meio Ambiente; Presidente do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGen)
C/C: Exmo. Sr. Gilberto Kassab, Ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações; Câmara
Setorial da Academia do CGen.
Senhor Ministro,
Entendemos que a nova Lei da Biodiversidade (Lei Nº 13.123/2015, Decreto No 8772/2016) traz avanços para a proteção do patrimônio genético e do conhecimento tradicional associado da biodiversidade brasileira. Entretanto, expressamos aqui nossas graves preocupações com aspectos da regulamentação que podem levar ao colapso as pesquisas brasileiras em Taxonomia, Sistemática Biológica e áreas correlatas (doravante referidas como T&S). Esses estudos são cruciais para o conhecimento e conservação da biodiversidade, pois envolvem a descrição, identificação, mapeamento, classificação e estudo das interrelações evolutivas dos seres vivos. Para atingir esses objetivos, estudos de T&S precisam amostrar grandes quantidades de espécies frequentemente distribuídas por vários países ou continentes. Por isso, pesquisas em T&S exigem a remessa e recebimento rotineiro de material entre instituições sediadas em diferentes países. Pesquisas em T&S não envolvem bioprospecção, desenvolvimento tecnológico ou qualquer outra atividade que resulte em possível exploração comercial. O material biológico empregado nesses estudos consiste em espécimes mortos (ou partes corporais) submetidos a processos de desidratação ou preservação em reagentes químicos que inviabilizam a extração de compostos orgânicos que possam ser comercializados.

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O Brasil é o país detentor da maior biodiversidade do planeta e desempenha papel de destaque em pesquisas de T&S, com uma das maiores e mais ativas comunidades científicas do mundo nessa área. Nossas instituições conquistaram ao longo dos últimos 30 anos uma reputação internacional invejável e equivalente àquela outorgada a instituições de países desenvolvidos. Essa credibilidade está sendo rapidamente erodida pelos entraves impostos pela nova legislação. Muitas instituições internacionais estão deixando de atender as solicitações de pesquisadores do Brasil, pois já não acreditam na capacidade do país de continuar produzindo pesquisas de ponta em T&S e de assegurar o translado e devolução devidos de material biológico. Assim, a mesma legislação criada com o propósito de proteger nossa biota está paradoxalmente sufocando as pesquisas mais fundamentais sobre o tema. Se tais distorções não forem urgentemente sanadas, a Lei da Biodiversidade será eternizada como sendo um retrocesso para o conhecimento e conservação da biodiversidade brasileira.

Atenciosamente,
Pesquisadores de instituições e sociedades científicas brasileiras abaixo assinados

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