Estradas e Unidades de Conservação

20130308

A carência de trabalhos científicos sobre os efeitos ecológicos de estradas no Brasil, e a importância do tema, tido como um dos principais fatores de perda de biodiversidade no mundo, resultou na idéia original deste trabalho. A vegetação cada vez mais fragmentada e degradada, por conta principalmente da abertura de estradas e da ocupação de novas áreas no Domínio da Floresta Atlântica, exige estudos e necessariamente ações que visem a recuperação das áreas já descaraterizadas, e propostas que pelo menos diminuam os efeitos negativos da fragmentação florestal.

A relação entre estradas e biodiversidade envolve muitas variáveis. Os fatores ambientais, sociais, culturais e econômicos, entrelaçados em uma complexa rede de interações, são reflexos da história do desenvolvimento de um país ou região e, portanto, apresentam alto grau de especificidade. Os inúmeros trabalhos e revisões disponíveis na literatura sobre efeitos ecológicos de estradas são essencialmente estrangeiros, sendo os nacionais restritos, na sua maioria, a levantamentos de animais atropelados. São dados importantes, mas isoladamente não retratam a dura realidade dos fatos e, como se verá adiante, não são suficientes para diagnosticar a magnitude dos efeitos negativos provocados pelas estradas sobre a biota.

Estradas são vitais para o crescimento da economia de uma nação.Geram novas oportunidades de serviços e empregos, e a instalação de novos pontos residenciais e industriais, o que resulta na atração de pessoas para áreas antes não habitadas. Muitas destas novas áreas ocupadas por estradas e, consequentemente, urbanizadas, são ecologicamente vulneráveis ou apresentam alto risco de perda da integridade biótica das comunidades que compõem a paisagem.

Toda paisagem que recebe estradas está associada à ocorrência de impactos negativos sobre a integridade biótica, tanto de ecossistemas terrestres como aquáticos. Como exemplo, pode-se citar as unidades de conservação que apresentam estradas ativas e de alto fluxo dentro dos seus limites, que além de fragmentar a paisagem, modificam a ecologia das comunidades que compõem as suas margens.

Estradas antecipam os efeitos da fragmentação através da prévia divisão de grandes manchas de habitat original em manchas menores, e pela criação de uma barreira que dificulta a movimentação e a dispersão entre manchas de habitats adjacentes. A fragmentação de áreas naturais por estradas, afeta negativamente as espécies que: i) não se adaptam bem em habitats de borda; ii) são sensíveis ao contato humano; iii) ocorrem em baixas densidades; iv) são improváveis ou
incapazes de atravessar estradas; e v) procuram estradas para se aquecer ou se alimentar. Os mesmos autores sugerem que estradas podem atuar tanto como barreiras, como corredores, ou ambos.

Estradas e população formam uma alça de retroalimentação positiva; quando a população aumenta, aumenta também a necessidade de construção de novas estradas. Estradas também aumentam os valores das terras, levando os colonos originais a venderem as suas terras para recém-chegados que desmatam mais rapidamente. A melhoria dos transportes para produtos agrícolas torna a agricultura mais rentável, levando os colonos a desmatarem e plantarem em áreas maiores.

Os tamanhos populacionais, os anseios da população e decisões dos governantes de um país ou região, são os verdadeiros responsáveis pelo crescimento da malha rodoviária, muitas vezes desordenada. E, ao contrário do que se imagina, a fase que mais impacto provoca, em estruturas florestais, é a fase de estudos iniciais, pois é nesta fase que são tomadas as decisões relativas a ocupação do espaço e acessibilidade.

Toda obra rodoviária tem um grande potencial modificador do ambiente em que se insere. As estradas causam vários impactos no ambiente, como a poluição sonora e luminosa, causada pelo trânsito e faróis de veículos, a produção de areia, pó de asfalto e outras partículas metais (Pb, Cd, Ni, Zn) e gases (CO e NO). O aumento da luminosidade no local, a diminuição da umidade do ar, alteração da vegetação que compõem as margens das estradas, invasão de espécies exóticas, tráfego indiscriminado de veículos automotores, fragmentação interna e a intensificação dos efeitos de
borda, são exemplos da capacidade de modificação do ambiente natural de estradas inseridas em unidades de
conservação (UC´s).

As estradas que cruzam áreas de reservas ou ecossistemas naturais causam impactos relevantes, com reflexos que afetam negativamente a diversidade biológica da área. Além da destruição física de parcelas de habitat natural, os impactos notados são: a fragmentação de habitats naturais, a criação de uma barreira entre os fragmentos, e a morte de animais por atropelamento abrangendo todos os grupos animais, com exceção daqueles restritos a habitats aquáticos.

Observou ainda, que os atropelamentos são diretamente relacionados às características da rodovia e da área por ela cruzada, e à densidade de animais no seu entorno.

Estradas, trilhas e linhas elétricas são muitas vezes necessárias em unidades de conservação para favorecer o fluxo de veículos e a manutenção da infra-estrutura para diversos fins, dentre eles a visitação pública, atividades de educação ambiental e combate a incêndios florestais. No entanto, existem alguns parques no Brasil que possuem estradas internas ativas e de alto fluxo, que representam um grande risco de degradação e perda de biodiversidade.

Três exemplos são:

Parque Estadual do Rio Doce, Minas Gerais, que é atravessado por uma estrada não pavimentada (MG 122) que une o extremo leste ao oeste da unidade, perfazendo um total de 22 km;

Reserva Biológica de Sooretama, Espírito Santo, que é atravessada por 5 km da BR 101 e por 11 km da ES 358, separando a reserva em três grandes fragmentos;

Parque Estadual do Morro do Diabo, em São Paulo, que possui 14 km de estrada pavimentada no seu interior, que provocam perdas significativas nas populações naturais.

Fonte:Impacto de estradas sobre mamíferos terrestres: o caso do Parque Estadual do Rio Doce, Minas Gerais, tese de mestrado de Leandro Moraes Scoss

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