Produtores ganham por conservação

Córrego Goiapaba Açu

Empresas de exploração florestal tendem a buscar ganhos no mercado voluntário de crédito de carbono para compensar os custos das práticas sustentáveis.

Quando a pequena cidade de Extrema, no Sul de Minas Gerais, criou em 2005 uma lei municipal pioneira no País para pagar pequenos produtores rurais que se comprometessem a conservar nascentes e rios, ninguém imaginava a dimensão que a novidade teria poucos anos depois. Hoje iniciativas de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) existem em municípios de todas as regiões do Brasil. Em São Paulo, maior metrópole do País, em cinco anos dezenas de proprietários abriram mão de atividades produtivas para proteger uma área total equivalente a 747 campos de futebol, no entorno de mananciais que abastecem a população, em troca de benefícios financeiros que até o momento somaram R$ 1,1 milhão.

Como resultado, mais de cem nascentes e 45 mil metros de extensão de rios foram salvos de desmatamento na Região Metropolitana de São Paulo. “O valor a ser recebido é calculado em função do custo de oportunidade da terra e do tamanho das áreas naturais mantidas intocadas”, diz André Ferreti, coordenador do Projeto Oásis, apoiado pela Fundação Grupo Boticário na capital paulista e diversas cidades. Em São Bento do Sul (SC), o processo foi iniciado no ano passado com participação de 18 propriedades às margens do Rio Vermelho, responsável pelo abastecimento de 75 mil habitantes. Outros 30 produtores estão na fila para receber a remuneração, coberta por meio de recursos da empresa municipal de água e esgoto.

A tendência é o modelo se expandir após a aprovação do novo Código Florestal, que prevê esse mecanismo de incentivo. Além disso, o Projeto de Lei 792/2007, específico sobre serviços ambientais, tramita na Câmara dos Deputados e em outubro foi debatido em audiência pública na Comissão Mista Permanente sobre Mudanças Climáticas. “É grande a demanda Brasil afora”, revela Ferreti, coordenador de um sistema de gestão digital inovador para projetos de PSA. A ferramenta foi desenvolvida a partir de uma metodologia com fórmula padrão aplicável aos diferentes biomas brasileiros.

“O modelo de cálculo dos benefícios considera a vazão de rios e número de nascentes, sendo concebido para incentivar proprietários a mudar o uso da terra em consonância com práticas conservacionistas”, explica Ferreti. O novo suporte tecnológico começou a ser utilizado em municípios como Baturité (CE), Palmas (TO) e São José dos Campos (SP), que desenvolvem iniciativas independentes, sem vínculo com o Projeto Oásis, que até hoje protegeu 714 nascentes no país, mediante remuneração anual que variou de R$ 336 a R$ 50 mil por proprietário.

Em Apucarana (PR), a ideia surgiu depois que o Ministério Público negociou um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) junto a produtores irregulares. Há três anos, 64 deles começaram a ser remunerados para proteção da bacia do rio Pirapó. Hoje o projeto abrange duas outras bacias hidrográficas, com o triplo de beneficiados recebendo até R$ 577 mensais em contratos anuais. “Parte do valor é inicialmente utilizado para a legalização das terras”, conta Edson Denobi, gestor ambiental da Companhia de Saneamento do Paraná. A empresa repassa 1% do faturamento local com água e esgoto ao Fundo Municipal de Meio Ambiente, que por sua vez faz o desembolso para os proprietários rurais, que em sua maioria cultivam café, soja e milho. Neste ano, serão liberados R$ 393 mil para conservar 614 nascentes. “Como resultado da conservação da água, ninguém sentiu os efeitos da última estiagem prolongada, ao contrário de anos anteriores”, ressalta Heloisa Beffa, secretária municipal de meio ambiente. Para 2013, mais de dois mil produtores aguardam a vez.

Carbono financia manejo florestal – Em função dos baixos preços da madeira no mercado, em parte consequência do grande volume de produto ilegal comercializado no país, empresas de exploração florestal tendem a buscar ganhos no mercado voluntário de crédito de carbono para compensar os custos das práticas sustentáveis.

Ao exigir a extração de toras por métodos de baixo impacto e a adoção de critérios sociais, o selo socioambiental prepara os empreendimentos para novos processos e funciona como um aval para a aprovação de projetos de carbono. “Só a madeira não paga os investimentos no manejo ambientalmente correto”, afirma Karen Anjos, gerente de responsabilidade social do Grupo Cikel, proprietário de 320 mil hectares de florestas certificadas pelo FSC no município de Paragominas (PA).

Após dois anos de trabalho em parceria com o grupo holandês 33 Forest Capital, a empresa concluiu em julho o registro e validação de um projeto de REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação) para o lançamento de 3 milhões de créditos de carbono já disponíveis no mercado. A iniciativa resulta da estratégica de não criar gado em 27 mil hectares, correspondentes a uma parte dos 20% da propriedade fora da reserva legal, onde o Código Florestal permite desmatar para produzir. As emissões evitadas em dez anos produzindo madeira mediante manejo certificado, somam 9,4 milhões de toneladas de carbono.

Mais 167 mil hectares já foram auditados e estão em processo de registro na plataforma Voluntary Carbon Standard (VCS). A expectativa é a comercialização do crédito de carbono por no mínimo 10 euros a unidade. “O projeto prevê a certificação socioambiental da área para garantia de controle do manejo e boas práticas nas questões sociais”, diz Karen, lembrando que a reserva indígena Amanayé localizada no entorno será alvo de um programa de resgate cultural.

O projeto da Cikel, com investimentos de US$ 1 milhão, é o maior dos 12 registrados até agosto deste ano no VCS em nível global. A metodologia é implementada com base nos padrões do The Climate, Community and Biodiversity Aliance (CCB).

Fonte: http://www.valor.com.br