Traçando a complicada história da origem humana

Por John Noble Wilford do “The New York Times”
Exposição "Evolução Humana" no MBML

Exposição “Evolução Humana” que acontece no Museu de Biologia Mello Leitão

Em 30 de julho de 2012 a Folha de São Paulo publicou uma entrevista com o paleoantropólogo britânico Chris Stringer é uma autoridade na evolução humana. Stringer, 64, é antropólogo do Museu de História Natural de Londres e membro da Royal Society.

Para os cientistas que estudam a origem do Homo sapiens, a pesquisa avança em três frentes. Fósseis de ossos expõem alterações anatômicas, a genética mostra a cronologia e o lugar da “Eva” dos humanos modernos e a arqueologia revela artefatos antigos que refletem o pensamento abstrato e criativo e uma crescente autoconsciência.

A seguir, trechos da entrevista:

P. O senhor escreveu que em 1970 a origem dos humanos modernos quase não era reconhecida como um assunto digno de estudo. O que mudou?
R. Em 1970, para algumas pessoas, não havia uma só origem: nós evoluímos no mundo todo. Havia uma visão de que em diferentes regiões uma espécie anterior, o Homo erectus, evoluiu para os humanos modernos. Isso era conhecido como multirregionalismo.
Dizia esse argumento que nós continuamos como uma espécie porque houve um cruzamento entre as diferentes populações. Os neandertais na Europa seriam os ancestrais dos europeus modernos e o Homo erectus na China seria o ancestral dos asiáticos modernos. E o Homem de Java seria um antepassado distante das populações modernas de aborígenes australianos. Os estudos de DNA tiveram um impacto enorme.

P. E a Eva africana? Isso estabeleceu uma data aproximada para a origem genética dos humanos modernos, na África.
R. A publicação da Eva Mitocondrial em 1987 foi um momento-chave. Aí estavam dados independentes, do nosso DNA mitocondrial, sugerindo que tivemos origem em uma só população na África, talvez há 200 mil anos. A África foi o único lugar que revelou uma transição de humanos arcaicos para modernos.

P. O senhor propõe que não houve um lugar só na África onde os seres humanos modernos se originaram.
R. Os dados de DNA mostram que essencialmente cada um dos nossos genes tem uma história evolutiva separada. Então, não há um ponto único na África que geneticamente pareça ser o lugar das nossas origens.
A África é um lugar enorme. Populações em áreas diferentes teriam florescido brevemente, desenvolvido novas idéias e, então, talvez morrido -isso estava sendo controlado pelo clima-, mas não sem antes trocar genes, ferramentas e estratégias comportamentais.
Isso continuou acontecendo e começamos a ver o padrão moderno, comportamental e fisicamente, se aglutinando a partir dessas regiões diferentes para dar origem aos seres humanos modernos, há 60 mil anos.

P. A arte rupestre da Europa influenciou a visão de que o comportamento moderno começou lá há 40 mil anos. Até que ponto essa nova visão é firme?
R. Eu argumentaria que quando os humanos modernos saíram da África, há, digamos, 60 mil anos, fundamentalmente eles eram modernos do ponto de vista comportamental.

P. O senhor aceita as novas evidências de cruzamento entre o neandertal e o Homo sapiens?
R. Essa é uma das notícias notáveis do último par de anos. Nós reconstruímos o genoma dos neandertais e, sim, ele mostra que as pessoas fora da África têm, em média, cerca de 2,5% de DNA neandertal nelas. Claramente houve um cruzamento viável.

P. Quem eram os denisovanos?
R. Essa é uma descoberta extraordinária. Alguns poucos dentes e um osso de dedo produziram um genoma postado no site do Instituto Max Planck de Biologia Evolutiva, em Leipzig, Alemanha. Parece que os denisovanos foram um dos primeiros ramos na linhagem do neandertal.
Eles são conhecidos apenas a partir de um local na Sibéria, e seu DNA aparece nas pessoas de hoje -lá na Austrália e na Nova Guiné. Isso é extraordinário. Implica que os denisovanos devem ter sido um grupo espalhado.

P. Poderíamos algum dia clonar esse povo extinto?
R. Teoricamente, você poderia recortar e colar essas mutações denisovanas em um genoma humano moderno e, então, implantar isso num óvulo e criar um denisovano.
Acho que isso seria completamente antiético. Trazer indivíduos isolados de volta, para a nossa própria curiosidade ou propósitos arrogantes, seria completamente errado.

P. Qual é o futuro da evolução humana?
R. Os geneticistas já demonstraram quantas mudanças genéticas houve nos últimos poucos milênios, porque passamos por grandes mudanças com a urbanização, a agricultura A seleção ainda está agindo em muitas populações humanas. Além disso, todos nós temos 50 mutações em nosso DNA em comparação aos nossos pais. Então, ainda estamos evoluindo. Vamos continuar a evoluir.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/newyorktimes/57508-tracando-a-complicada-historia-da-origem-humana.shtml