Internet pode inspirar novas formas de educação

20130205
Pesquisa questiona a visão da escola como único e centralizador polo de difusão de conhecimentos, e enxerga na cultura libertária da web a inspiração para mudanças estruturais na educação.

Os usos das novas tecnologias pelos alunos da Educação para Jovens e Adultos (EJA) não começa nas escolas. Com sua grande e complexa estrutura, a instituição escolar não representa, para estas pessoas, um meio facilitador de interação com as mais recentes inovações tecnológicas. É o que aponta pesquisa da Faculdade de Educação (FE) da USP, que questiona a visão da escola como único e centralizador polo de difusão de conhecimentos, e enxerga na cultura libertária da internet a inspiração para mudanças estruturais na educação, como as “comunidades de aprendizagem”.

A professora Bianca Santana é a autora da dissertação de mestrado Jovens e adultos em processo de escolarização e as tecnologias digitais: quem usa, a favor de quem e para quê? Além de um breve estudo sobre a região, a pesquisadora entrevistou 30 alunos entre os anos de 2011 e 2012, em salas da EJA, desde a alfabetização até o ensino médio, situadas em cinco escolas públicas nos bairros de Brasilândia e Freguesia do Ó, zona norte de São Paulo, com o objetivo de compreender a relação entre utilização de novos adventos tecnológicos e a escola.

A aplicação dos questionários revelou que, entre os entrevistados, 75% já tinham computador em casa; mais de 50% já haviam concluído curso de informática; 26% tiveram o primeiro acesso à internet realizado em casa, 35% em “lan houses” e apenas 15% haviam acessado a grande rede de computadores nas escolas pela primeira vez. Os principais usos da internet apontados pelos entrevistados foram: realização de pesquisas gerais, utilização de redes sociais e emails, downloads de filmes e músicas, e recreação com jogos online.

Para Bianca, os resultados demonstram que a importância da escola como meio de introduzir novas tecnologias para jovens e adultos da EJA é praticamente nula: “Uma das perguntas feitas era sobre a quem os alunos recorriam quando tinham dúvida na utilização de computadores, e nenhum dos 30 entrevistados respondeu ‘ao professor’. As pessoas que ajudavam a solucionar suas dúvidas eram os amigos, filhos, netos, monitores de lan houses.”

Além de constatar a desarticulação entre usos de novas tecnologias e alunos da EJA, o estudo demonstra outros sintomas da dificuldade de escolarização de adultos: “Hoje o campo da EJA sofre uma dificuldade muito grande nas políticas públicas de educação. Existe pouca valorização da sociedade em geral acerca da EJA, e pouco incentivo para que adultos estejam nas escolas. A EJA é o primo pobre da educação”, relata a professora.

Comunidades de Aprendizagem
Bianca afirma que, seu estudo demonstra como é difícil a implementação de políticas públicas que venham de “cima para baixo”: “Nos escritórios e gabinetes podemos pensar e imaginar as mais diversas, criativas e inovadoras políticas para a educação. Entretanto, quem aplica essas políticas, os professores e os alunos, em última estância, é que de fato conhecem as demandas e as necessidades reais de mudança na educação, o que pode dar certo ou errado.”

Como possível saída para o impasse, Bianca propõe a reflexão acerca das “Comunidades de Aprendizagem”, a articulação das escolas com outros equipamentos de seu entorno: “Se o Telecentro ou mesmo as Lan Houses são lugares onde as pessoas podem aprender sobre novas tecnologias, isso não precisa necessariamente acontecer na escola. As escolas podem ser, no caso da EJA, o local onde os adultos aprendem a ler e escrever, e até mesmo, conhecimentos básicos de informática, mas não podem ser a única fonte de conhecimento.”

Segundo o estudo, mesmo a questão burocrática referente a emissão de certificados por parte da escola poderia ser resolvida. As comunidades de aprendizagem poderiam promover o encontro de profissionais de uma determinada área e interessados em conhecer sobre aquele campo de trabalho. Após o repasse de conhecimentos e saberes, a escola poderia emitir um certificado de formação para os ‘alunos’. Desta maneira, os saberes seriam diversificados, e a responsabilidade única da escola no repasse de conhecimentos dignos de certificação, descentralizada.

Bianca acredita que, mais do que comprar aparelhos eletrônicos de última geração, se quisermos pensar a tecnologia na escola, e, mais especificamente na EJA, deveríamos nos basear em como se organiza a arquitetura da Internet atualmente: “É urgente repensarmos o direito humano a educação, e como o podemos viabilizar. O principio básico e mais interessante da internet é que todas as pontas, todos os computadores, têm igual ‘poder’ de emitir e receber informações. A internet é fantástica por conta de sua perspectiva igualitária e libertária. A escola não têm que necessariamente resolver tudo, e a educação popular no campo da EJA, a exemplo da internet, deveria ter currículos abertos, flexíveis e conectados a seus alunos, que já possuem muitos saberes e experiências de vida.”

Educação de Jovens e Adultos – EJA – Modalidade de ensino nas etapas dos ensinos fundamental e médio da rede escolar pública brasileira e adotada por algumas redes particulares que recebe os jovens e adultos que não completaram os anos da educação básica em idade apropriada.

Após dez anos da formulação do Plano Diretor de São Paulo, a educação na rede municipal passa por problemas. A prefeitura reduziu em quase 50% as vagas para jovens e adultos na rede de ensino. Para a professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo – FEUSP, Lisete Arelaro, o EJA – Educação de Jovens e Adultos – EJA vem passando por um empobrecimento das oportunidades. “Antes, havia centros de educação para jovens e adultos que ofereciam possibilidades variadas de cursos técnicos integrados com a sua formação. Hoje, há praticamente um só curso, o de Informática”, disse.

Denise Carreira, coordenadora de Educação da ONG Ação Educativa, especializada em políticas educacionais, avalia que a educação de jovens e adultos não se constitui como prioridade para os governos. “É necessário que haja uma política que promova um modelo flexível e de qualidade, que faça sentido na vida dessas pessoas”, explicou Carreira.

Além dessa mudança, os Centros de Educação Unificados – CEUs perderam sua proposta inicial de integrar cultura, ensino e esportes nas comunidades em que foram construídos. “Hoje, as atividades dos CEUs são poucas e eles deixaram de ser um centro de reunião para a comunidade”, afirmou Arelaro à Rádio Brasil Atual.

A realização de um censo educacional para identificar as demandas existentes, primeira ação estratégica do Plano Diretor de São Paulo, também não aconteceu. “O último Censo Escolar, feito de casa em casa, foi realizado em 1970”, contou a professora.

Referencias: http://www.jornaldaciencia.org.br e http://www.blogeducacao.org.br